Motivado para trabalhar com os desafios e oportunidades das cidades” foi como Rodrigo Perpétuo definiu sua entrada como novo secretário-executivo do Secretariado Regional do ICLEI para a América do Sul. Mineiro, 41 anos, Perpétuo é mestre em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), e formado em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Tem especializações em gestão de negócios pela Fundação Dom Cabral e em Cooperação Descentralizada pela Universidade Aberta da Catalunha. Ao longo de sua trajetória profissional, acumulou experiências no setor privado, trabalhando com gestão de negócios, tecnologia e educação internacional, na academia, como professor de Relações Internacionais, e no setor público.
Iniciou sua experiência com a gestão pública a convite da Prefeitura de Belo Horizonte, cidade Membro do ICLEI, em 2005, para estruturar e chefiar uma inédita Secretaria de Relações Internacionais. Por lá ficou por pouco mais de uma década, período no qual trabalhou para reunir e ampliar o trabalho de relações internacionais que já vinha sendo realizado no município de forma descentralizada.
À frente da Secretaria Municipal, Perpétuo encarou desafios como desempenhar o papel de secretaria executiva da Rede Mercocidades, rede que trabalha pela participação das cidades sul-americanas nos processos de integração regional, presidir o Fórum Nacional de Secretários e Gestores Municipais de Relações Internacionais (Fonari) de 2011 a 2013, e participar de outras redes temáticas e associações globais, como a Associação Internacional das Cidades Educadoras, e o Centro Iberoamericano de Desenvolvimento Estratégico Urbano. “Tive a oportunidade de desenvolver trabalhos que dialogam com a lógica contemporânea de redes de cidades, de fluxos internacionais convergentes e complementares, atuando em âmbito regional”, explicou o secretário-executivo do ICLEI para América do Sul. Em 2015, foi convidado para chefiar a Secretaria de Relações Internacionais do Estado de Minas Gerais, onde coordenou a implantação de iniciativas inovadoras, como o “Programa de Internacionalização Regionalizada”.
Durante seu trabalho na Prefeitura de Belo Horizonte, aproximou-se do ICLEI quando a cidade teve a oportunidade de sediar o Congresso Mundial da organização, em 2012. Foi a primeira edição realizada na América do Sul e uma das maiores em termos de participação. “Nós tivemos uma participação ampla, não só dos membros da região – e também de outros continentes -, mas tivemos sessões abertas para universidades, fundações e sociedade civil organizada. Foi uma edição que marcou a história da organização também por ter sido a maior”, contou a respeito de sua experiência com a articulação e organização do evento. “Tenho uma história de proximidade e de sucesso com ICLEI que me motiva ainda mais ao assumir esse cargo”.
Ele inicia suas atividades neste mês e se diz animado pelas grandes oportunidades colocadas para as cidades e governos locais da região, que neste ano vai sediar um dos mais importantes encontros ligados à agenda urbana e o desenvolvimento sustentável, o Habitat IIII. “O desafio é transportar a experiência que tive pela ótica dos governos municipal e estadual, e entender quais são as dificuldades dos membros, as dificuldades de quem milita do outro lado implementando as políticas, e, a partir daí, facilitar o papel do ICLEI, enquanto uma organização que tem como seu principal objetivo fazer com que os governos locais possam se comprometer cada vez mais com políticas de sustentabilidade e de mudanças climáticas, e fortalecer o componente ambiental da gestão pública local no Brasil e na América do Sul.”
Confira a seguir a conversa com Rodrigo Perpétuo:
ICLEI SAMS: De que forma sua trajetória na gestão pública irá lhe ajudar na atuação dentro do ICLEI, uma das maiores associações mundiais de cidades para o desenvolvimento sustentável?
Rodrigo Perpétuo: O esforço que necessariamente vou trazer para a caminhada junto ao ICLEI é o de proximidade com as cidades e com os governos regionais do nosso continente. Essa convivência nos ensina enquanto organização, e nos ensina também a enxergar qual é a carência do nosso Membro ou do nosso parceiro que precisa do ICLEI para ajudá-lo lá na ponta. Por outro lado, buscar uma proximidade também com o sistema internacional. O ICLEI, enquanto uma organização que tem como objetivo recolher no sistema internacional as grandes tendências, os acordos internacionais e traduzi-las para a linguagem de um prefeito, de um governador, também precisa estar perto dessas agendas. Já o faz, por meio do Secretariado Mundial, mas a nossa instância sul-americana vai ter também esse desafio de conviver de uma maneira muito próxima das organizações internacionais que pautam o sistema internacional na perspectiva do desenvolvimento sustentável.
ICLEI SAMS: Na sua opinião, quais são os principais desafios enfrentados pelas cidades para realizar uma gestão voltada para desenvolvimento sustentável? Como vê isso especificamente para o Brasil e para países da América do Sul?
RP: Um grande desafio é a heterogeneidade dos nossos Membros e parceiros, dos governos locais da nossa região, tanto do Brasil como da América do Sul. Nós temos grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro, Bogotá, Buenos Aires, mas temos cidades muito pequenas. Por mais que os temas sejam os mesmos – como resíduos sólidos, mudança do clima – a forma de manifestação desses desafios em cidades de diferentes portes e em países com características particulares é muito distinta. Então, um desafio é conseguir fazer uma leitura que consiga ser geral, completa em termos das características do perfil daquele componente temático da nossa agenda, mas ao mesmo tempo ser capaz de fazer um atendimento individualizado, particularizado para a necessidade local que é muito distinta para um tipo de cidade inserida num perfil de um determinado país. Esse é um desafio, mas que o ICLEI tem, por sua trajetória e por tudo que representa e acumula, toda a condição de superar.
Em termos mais gerais, acho que a dificuldade das cidades é sempre conseguir fazer a leitura daquilo que é um acordo internacional e que pauta uma determinada linha de ação e transformar isso um programa ou política pública localizada e adequada para suas características e necessidades específicas. As cidades, principalmente as de menor porte, tem dificuldades técnicas e acho que o ICLEI tem cumprido um papel de auxiliá-las nessa perspectiva. Por outro lado, cidades maiores têm capacidade técnica, mas sempre têm o desafio de financiar suas políticas na escala em que elas precisam ser implementadas, e aí acho que o ICLEI também pode ser um parceiro, não só aperfeiçoando bons projetos que já estejam em processo de implementação, mas também ajudando essas cidades maiores a financiar, buscar parceiros e dar escala aos seus projetos. Em termos de agendas mais urgentes, eu diria que a de resíduos sólidos é uma que de fato incomoda o Brasil e a América do Sul, e da qual o ICLEI já tem proximidade e tem projetos com diversos membros e governos nacionais, como o próprio Governo Brasileiro, e acho que a gente pode dar uma contribuição no próximo ciclo de prefeitos, especialmente no Brasil, e na nossa região como um todo. Eu sinto que há uma percepção por parte das autoridades locais, prefeitos e governadores, com relação a sua possibilidade de compromisso e de desenvolvimento de políticas que vão influenciar na dinâmica de enfrentamento às mudanças climáticas. O ICLEI também vem fazendo um trabalho de sensibilização e pactuação dos prefeitos e, além de seguir com essa agenda, que é muito importante, o ICLEI pode dar uma contribuição técnica para que esses prefeitos não só se comprometam, mas também possam implementar programas que contribuam para a redução das emissões.
ICLEI SAMS: Acredita que há abertura e adesão das cidades a essa agenda?
RP: A adesão ou o compromisso das cidades com a agenda do desenvolvimento sustentável realmente acontece, mas ela pode acontecer de maneira mais intensa e mais qualificada e acho que esse é o propósito do ICLEI. Então, nosso desafio é realmente oferecer para aquele governo local que é nosso membro, uma possibilidade de diferenciação em relação àquele governo local que se compromete e tem também as suas políticas, mas não participa diretamente da nossa rede. Nunca vamos ser uma rede que vai se fechar. Nós vamos dialogar com todos, mas aqueles que estão dentro da nossa associação certamente vão conseguir, ao final de um período, ter políticas e iniciativas diferenciadas e programas que se destaquem e deem resultados para a população desses governos e inspirem outros a seguir o mesmo caminho. É isso que eu espero.
ICLEI SAMS: Quais serão as suas prioridades à frente do ICLEI para América do Sul, considerando o seu contexto de diversidade e de grande amplitude territorial?
RP: Nós temos agendas internacionais importantes a nossa frente. Temos o Habitat III que acontecerá em nossa região, em Quito. Então, teremos um protagonismo em relação a essa agenda e, especialmente, no que se refere ao engajamento dos nossos membros com essa agenda e com as iniciativas que o ICLEI vai coordenar, conduzir e fomentar, e que estejam relacionadas ao evento. Especialmente, porque vão haver desdobramentos que influenciarão toda a agenda urbana nos próximos 20, 30 anos. A COP 22 também vem aí. A COP 21 foi um grande sucesso, mas os governos locais ainda se perguntam como aproveitar o momento de mais recursos destinados a políticas de enfrentamento e adaptação às mudanças do clima. Acredito que nosso papel é conseguir traduzir para os governos locais da nossa região as oportunidades que o sistema internacional vai cada vez mais oferecer nessa agenda. E, também, dar sequência ao que já vem sendo implementado, aos projetos que estão em curso, mantendo um diálogo permanente com Membros e parceiros e uma proximidade que nos permita aprender ao máximo com a nossa rede, que já é consolidada.