A 23ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP23), em Bonn, na Alemanha, chegou ao fim em 18 de novembro de 2017. Reunimos neste documento nossas conclusões mais relevantes e a avaliação do que tudo isso significa para os governos locais e regionais e para a ação climática global.
1. A COP23 provou que o Acordo de Paris não pode ser contido e é irreversível – e do qual os governos locais são importantes guardiões.
Os governos locais e regionais tiveram um papel de liderança claro nesta última COP. Agora eles estão em destaque, com uma voz que está ganhando influência no decorrer do tempo
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Este é um momento político importante para a ação climática a nível global. Embora as expectativas iniciais eram de uma COP de encaminhamentos, a COP23 rapidamente se transformou em um evento muito maior e mais relevante.
Isso aconteceu, pelo menos em parte, devido ao fato de os EUA anunciarem sua retirada do Acordo de Paris em junho passado. Isso imediatamente provocou uma reação por milhares de cidades e regiões, bem como de grandes empresas e instituições acadêmicas nos EUA e em todo o mundo. Em particular, os grupos interessados norte-americanos declararam firmemente que ainda estão envolvidos na ação climática.
Desde que os governos locais e regionais foram reconhecidos oficialmente no Acordo de Paris, eles estão assumindo um papel mais central na conversa sobre mudanças climáticas. Na COP23, líderanças locais mostraram que estão desempenhando um papel importante e constante na ação climática global.
Esta edição foi um marco em termos do tamanho e da diversidade da delegação presentes ao evento da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC). Participaram da delegação na COP23 1000 delegados, com mais de 300 líderes. Da América do Sul, participaram mais de 40 delegados de 19 cidades, dentre eles prefeitos das cidades de Rosário (Argentina), Campinas (Brasil), Manaus (Brasil) e Palmas (Brasil) e representantes das cidades associadas à Rede ICLEI de: Buenos Aires (Argentina), Rosario (Argentina), La Paz (Bolívia), Belo Horizonte (Brasil), Campinas (Brasil), Curitiba (Brasil), Londrina (Brasil), Manaus (Brasil), Estado de São Paulo (Brasil), Niterói (Brasil), Palmas (Brasil), Porto Alegre (Brasil), Recife (Brasil), Salvador (Brasil), Area Metropolitana do Valle de Aburrá (Colômbia) e Quito (Equador).
Também foi a primeira vez na história das COPs que um evento de líderes locais e regionais foi enquadrado como uma colaboração com a Parceria de Marrakesh para a Ação Global do Clima – processo através do qual os stakeholders não-Parte comprometem-se com as ações climáticas globais. Isso sinaliza a centralidade e a importância dos governos subnacionais no impulsionamento do progresso global.
2. Os objetivos nacionais não são suficientemente fortes e a lacuna das emissões globais é enorme – Este é o momento perfeito para envolver os governos locais e regionais no cumprimento dos compromissos nacionais e aumentar as ambições globalmente.
De acordo com uma análise recente da UN Environment, os compromissos nacionais atuais cobrem apenas um terço das reduções de emissões necessárias para manter a temperatura global bem abaixo de 2˚C. Além disso, há indícios de que o orçamento de carbono global disponível para o cenário de 1,5˚C esgotará até 2030.
A Cúpula Climática de Líderes Locais e Regionais em si foi uma demonstração real de que a governança multinível não é apenas um conceito que está levado pelos atores subnacionais. Na verdade, esse processo tem cada vez mais legitimidade e importância para os governos nacionais. A Cúpula – co-organizada por uma parceria multinível entre a Cidade de Bonn e o estado de Renânia do Norte-Vestefália – foi notável em termos de representação de todos os níveis de governo.
A temática de governança multinível e colaboração entre níveis de governo também pautou discussões no Pavilhão de Cidades e Regiões na Bonn Zone. Contando com a participação de representantes de governos municipal e federal da Argentina, Brasil e Colômbia, o ICLEI América do Sul trouxe o debate para o contexto da região e apresentou os desafios de implementação da NDC no contexto local. Dentre os principais desafios está acessar recursos financeiros internacionais e viabilizar linhas de financiamento para os municípios apoiarem na implantação da estratégia climática nacional.
O Compromisso de Líderes Locais e Regionais de Bonn-Fiji para Entregar o Acordo de Paris em Todos os Níveis, aprovado por centenas de lideranças na COP23, destaca que os governos locais e regionais em todo o mundo se comprometeram a fazer sua parte para reduzir as emissões globais: 1.019 governos locais e regionais que reportam ao ICLEI na Plataforma carbonn comprometeram-se coletivamente a reduzir suas emissões em 26,8 gigatoneladas até 2050. Ao mesmo tempo, o impacto agregado das 7.494 cidades e governos locais comprometidos com o Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia poderia reduzir coletivamente as emissões em 15,64 gigatoneladas entre 2010 e 2030. Além disso, mais de 100 estados e regiões informando seus dados à plataforma do CDP em 2017 poderiam reduzir as emissões em 21,9 gigatoneladas cumulativamente até 2050.
Esses compromissos sinalizam um forte nível de dedicação – porém é preciso ir além para garantir que os governos locais e regionais possam implementar políticas e planos de ação para apoiar diretamente os objetivos climáticos do Acordo de Paris. Na COP23, através da Cúpula Climática de Líderes Locais e Regionais e do Compromisso de Bonn-Fiji ficou claro que os governos nacionais podem cumprir seus compromissos e elevar ambições em todo o mundo, se e quando tornarem desenvolvimento urbano sustentável uma parte fundamental dos planos de ação climática nacional, conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas, e envolver plenamente todos os níveis de governos.
Neste momento em que as Nações estão definindo o conjunto de regras que regem o Acordo de Paris é extremamente importante considerar a componente local em seus planos de investimento, promovendo a governança multinível. Durante o Habitat + 1, em Quito, foram estabelecidas conversas com uma variedade de atores e a partir disso, cidades latino americanas, lideradas pelo prefeito de Quito, Mauricio Rodas, estão propondo um Chamado à Ação aos Líderes da América Latina para pressionar pela integração vertical das estratégias de implementação do NDC. Este convite será levado ao Summit One Planet, convocado pelo presidente da França, Emmanuel Macron, em dezembro.
3. O Diálogo Talanoa abre a porta aberta para parcerias multiníveis e multipartidárias – os governos locais agora têm a oportunidade e o dever de estender isso a todas as cidades e regiões do mundo.
O Diálogo Talanoa – também referido como o Diálogo Facilitador de 2018 – iniciará o processo no qual as nações revisarão seus planos climáticos atuais antes da próxima leva de NDCs a serem enviadas em 2020. Seu objetivo será melhorar a ambição, especialmente em direção à meta de 1,5˚C. Os governos locais e regionais, bem como outros públicos interessados não-Parte, foram encorajados a contribuir com o processo.
Foi particularmente importante que o resultado da COP23 convida os países e outros públicos interessados não-Parte a participar do diálogo para aumentar a ambição do processo da UNFCCC e para cada país. As cidades e as regiões serão, em consequência, muito mais bem posicionadas para influenciar o processo e aconselharem ou exercerão pressão sobre os seus governos nacionais para que façam mais sobre o clima e façam isso de forma mais rápida.
A COP23 trouxe uma série de iniciativas que visam unir diferentes níveis de governos para agir pelo clima. O ICLEI foi anunciado como o primeiro membro associado da Parceria NDC (NDC Partnership), e o Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia que agora conecta a Comissão Europeia às redes globais do governo local.
4. O avanço do Programa de Trabalho do Acordo de Paris possibilitou o progresso na construção de uma forte arquitetura climática global.
O Programa de Trabalho do Acordo de Paris foi indiscutivelmente o principal item da agenda da COP23. A evolução do título deste documento, que passou de “conjunto de regras” para Guia de Implementação para o Programa de Trabalho, já reflete que os resultados dos processos globais fornecerão apenas orientação básica, enquanto as decisões definidoras serão tomadas por cada país. Uma vez concluído, este documento será um conjunto detalhado de instruções acordadas sobre como reportar o progresso, alinhar a metodologia para contabilizar emissões e, de forma geral, implementar o Acordo de Paris em cada país – entre outras coisas.
Um rascunho antecipado foi liberado no final da COP: um documento com mais de 250 páginas reunindo várias posições. O documento final de resultados da COP23 reconheceu a necessidade de mais tempo para suavizar alguns pontos e pediu novas sessões em 2018 para continuar trabalhando no texto, a fim de ter o documento para aprovação na COP24 em Katowice, Polônia, em novembro.
5. O caminho adiante – temos 3 anos críticos a nossa frente para proteger o Acordo de Paris e o clima global.
Todos os níveis de governo e todas as partes interessadas na agenda podem ser encorajados pela crescente solidariedade em todo o movimento climático, mesmo que a realidade das mudanças climáticas nos confronte. Fiji, a nação que presidiu esta COP, espalhou uma inspiradora mensagem de unidade. Eles reuniram as nações e as partes interessadas para formar uma grande coalizão de atores do clima que impulsionam a ação global adiante.
Vários eventos importantes no final deste ano e até 2020 marcarão momentos cruciais de ação climática e advocacia.
2017
Cúpula do Macron: em julho, durante a Cúpula do G20, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou planos para realizar uma cúpula em Paris, em 12 de dezembro de 2017, dois anos após o acordo de Paris. A One Plane Summit deverá sediar uma série de anúncios e iniciativas direcionadas aos Chefes de Estado, inclusive o documento “Call to Action”, iniciativa liderada pelo prefeito de Quito e líder do RexCom do ICLEI para América do Sul, no qual lideranças latino-americanos reivindicam maior verticalização dos planos de investimento das NDCs.
2018
A partir de janeiro, o Diálogo Talanoa dará aos governos locais e regionais uma oportunidade sem precedentes para discutir planos climáticos com suas contrapartes nacionais em 2018.
Em março, a Conferência de Cidades e Mudanças Climáticas do IPCC, que terá lugar em Edmonton, no Canadá, avaliará o estado dos conhecimentos acadêmicos e práticos relacionados às cidades e as mudanças climáticas e estabelecerá uma agenda de pesquisa global baseada na identificação de lacunas importantes nas comunidades acadêmicas, profissionais e de políticas urbanas.
No Congresso Mundial do ICLEI, em junho de 2018, milhares de representantes de governos locais e regionais se reunirão em Montreal, Canadá, para mostrar seus compromissos e ação projetados para promover a sustentabilidade urbana.
2018 conclui com a COP24, na qual as Nações devem adotar o programa de trabalho final para a ação climática global.
2019
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, convocará a Cúpula do Clima das Nações Unidas de 2019 em Nova York, na sede da ONU. Assim como a anterior, realizada em 2014 e que impulsionou o acordo de Paris, esta Cúpula terá um papel importante para garantir que as ações e as ambições se acelerem antes de 2020. A Cúpula também pode alavancar o envolvimento dos interessados no processo de reforma da ONU A 25a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas deverá acontecer na América Latina entre novembro e dezembro, mas o país e a cidade ainda não foram definidos.
2020
Todas as nações e partes interessadas no clima precisam se surpreender e ao resto do mundo nos próximos anos e enviar uma forte mensagem através dessas plataformas globais. Precisamos atingir o alvo de 1,5 graus.
* Versão adaptada da publicação original. Acesse o texto na íntegra em inglês.