Amazônia: governos locais discutem proteção da floresta e desenvolvimento sustentável

Evento aconteceu durante o Daring Cities e também reuniu a sociedade civil

27 de out de 2020

Crédito: Michel Reyes

Na última terça-feira (20/10), o ICLEI América do Sul promoveu no Daring Cities o painel Amazônia: Desenvolvimento Urbano, Sustentabilidade e Parcerias.

 

O evento reuniu governos regionais e locais da Amazônia e sociedade civil em uma ampla discussão sobre o desenvolvimento sustentável na maior floresta tropical do mundo e dos governos em seu entorno, aliada a oportunidades para a construção de uma rede com foco na proteção da floresta por meio de um diálogo permanente.

 

“Os governos locais devem ter um protagonismo maior frente às dinâmicas amazônicas. O Pacto de Letícia nos conclama a engajar e intensificar a cooperação entre as nações amazônicas e os atores e líderes de governos que se fazem presentes”, declarou o secretário executivo do ICLEI América do Sul, Rodrigo Perpétuo, na abertura da sessão.

 

“É preciso conciliar a necessidade de equiparação do déficit de infraestrutura urbana que as cidades amazônicas possuem, a valorização da biodiversidade e do papel dos municípios na conservação do bioma amazônico, alinhado aos preceitos que nos levarão à COP15 de biodiversidade e à COP26 do clima”, prosseguiu Perpétuo.

 

O papel dos governos locais foi também ressaltado na fala da Nicole Stopfer, diretora regional do Programa de Segurança Energética e Mudança Climática na América Latina (EKLA), da Fundação Konrad Adenauer (KAS). “Os verdadeiros especialistas são os prefeitos, que vivem aquela realidade no dia a dia. O papel da cidade é de reforçar os compromissos políticos que foram estabelecidos nos últimos anos em defesa da conservação do meio ambiente. Todas as cidades têm uma visão particular perante o tema da Amazônia, e o papel do Fórum de Cidades Pan-Amazônicas (FCPA) é ajudar que se encontrem soluções em conjunto, baseadas na natureza” disse.

 

O FCPA tem sido articulado pelo ICLEI América do Sul, a Way-Carbon e o EKLA com o objetivo de estabelecer uma plataforma de governos subnacionais do Brasil, Peru, Bolívia, Colômbia e Equador para promover o intercâmbio de conhecimentos, práticas e modelos de desenvolvimento sustentável entre cidades amazônicas.

 

O atual prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, também participou do encontro, trazendo a perspectiva local sobre o potencial de se trabalhar a floresta em pé. “A floresta no chão vira cinzas, desolação, deserto, esvazia os rios, acaba com as nuvens que levam chuvas para toda a região e continente. Temos a possibilidade de crescer, criar prosperidade, garantir boa renda para os parceiros com a floresta em pé. Grande parte da reserva de água potável do mundo está aqui. Temos compromissos nacionais e históricos de desenvolver a região e proteger as populações ribeirinhas e indígenas”, pontuou.

 

“Uma governabilidade competente da Amazônia geraria respeito internacional. O Brasil deve ser uma potência em biotecnologia e não uma potência militar. Temos essa vocação, trabalhando desenvolvimento e sustentabilidade e protegendo os índios. Temos deveres com o mundo, responsabilidade com o que foi acordado em Paris em 2015, e a Amazônia é fundamental para isso, sendo um dos maiores esteios na luta contra o aquecimento global. Aqui não cabe garimpo. O mundo não aceita que nós não colaboremos na luta contra o aquecimento global”, adicionou Virgílio.

 

A representante do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ane Alencar, focou sua fala nos problemas do desmatamento e na centralidade da articulação das zonas urbanas da Amazônia para pensar o desenvolvimento sustentável na região. “Quando falamos que 100% dos focos de fogo da região são causados pelo ser humano, significa que tem alguém riscando este fósforo. Metade do território amazônico são áreas protegidas, terras indígenas ou Unidades de Conservação. Um quarto são áreas produtivas para a agropecuária. Outro quarto dessa área são florestas públicas que ainda não foram destinadas e terras devolutas, sem cadastro. Quando vemos o mapa do fogo, fica claro que os índios não são os que queimam a floresta”, observou Alencar.

 

“O principal câncer da Amazônia atualmente é a apropriação ilegal de terras públicas, gerando um problema grave de conflitos no campo, grilagem e desmatamento. Os governos locais são um importante ator na gestão da sustentabilidade e é preciso que haja uma articulação institucional para que os problemas amazônicos sejam combatidos. Uma ferramenta fundamental é engajar a população urbana nessa agenda pró-sustentabilidade e pró-governança”, reforçou.

 

Finalizando a sessão, aconteceu a fala inspiradora de Jaciara Borari, representante do povo indígena Borari e articuladora do Engajamundo. “Em nossa região há grilagem de terra, hidrelétrica, desmatamento ilegal. Não tem pra onde correr e também não queremos isso, pois estamos em nossa terra. Queremos que não nos expulsem daqui”, declarou. 

 

“Hoje, nós indígenas conquistamos espaços e estamos dentro da universidade, estamos nos formando e produzindo ciência por nós mesmos, aliando conhecimento empírico e técnico, conquistas que vamos buscando pouco a pouco”, adicionou. “Se continuar desse jeito, a Amazônia vai deixar de ser uma floresta tropical em 15 anos. Se queremos viver, precisamos que a natureza também esteja viva.”