Considerado um dos meios de implementação da agenda de mitigação e adaptação pela Convenção-Quadro das Nações Unidas de Mudança do Clima, o financiamento climático refere-se à execução de projetos e ações que visam reduzir as causas ou os efeitos da crise climática, compreendo recursos advindos dos setores públicos e privados, por meio de canais multilaterais, bilaterais, nacionais, regionais e privados.
De acordo com dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Climate Funds Update, a América Latina e o Caribe receberam US$ 7,9 bilhões para financiamento climático em 2019, provindos de bancos multilaterais de desenvolvimento. Já o Brasil recebeu, entre 2003 e 2016, US$ 853,1 milhões, tanto de fontes multilaterais quanto de bilaterais.
O território amazônico possui diversas iniciativas e articulações para promover o desenvolvimento sustentável. A agenda de financiamento climático em governos subnacionais da região, no entanto, tem recebido pouca atenção. Um mapeamento inicial das políticas e instrumentos em vigor nas capitais da Amazônia Legal brasileira evidencia que são poucas as cidades com uma agenda estruturada de mitigação e de adaptação.
Buscando reverter esse cenário, foi lançado o projeto “Financiamento para Ação Climática Local na Amazônia”, uma parceria entre o ICLEI América do Sul e o Instituto Clima e Sociedade (iCS) que tem a intenção de incrementar o acesso à financiamento para a ação climática local na região da Amazônia Legal brasileira.
Representantes locais
O projeto foi lançado em um webinar nesta terça-feira (29/06) que contou com a participação de 129 pessoas de mais de 54 localidades, incluindo membros das três esferas de governo, da academia, da sociedade civil e de organizações do terceiro setor.
Presidente da Agência de Desenvolvimento de Porto Velho, Marcelo Thomé ressaltou a necessidade de conectar as demandas e oportunidades da região amazônica com fundos privados e empresas que queiram investir neste território. O Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Manaus, Antonio Stroski, lembrou que a capital do Amazonas tem sido palco cada vez mais frequente de eventos climáticos extremos como grandes cheias que atingem a zona urbana e comunidades ribeirinhas. “Um impacto evidente das mudanças do clima”, pontuou.
Para o superintendente da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Virgílio Viana, o desafio atual da região é superar uma economia guiada pelo desmatamento para atingir uma economia voltada para a valorização da floresta em pé, criando soluções adaptadas à realidade amazônica e voltadas para as pessoas e para a conservação do capital natural. “Temos urgência na construção de programas de resiliência a eventos climáticos extremos na Amazônia, que já estão acontecendo. A agenda de adaptação é extremamente relevante e é preciso fortalecer a capacidade das prefeituras elaborarem projetos capazes de dialogar com os mecanismos de financiamento internacional.”
Amazonia Legal
Composta pelos estados do Amapá, Amazonas, Acre, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, a Amazônia Legal brasileira compreende 59% do território nacional, reunindo 772 municípios e aproximadamente 23 milhões de habitantes, dos quais 70% vivem em zonas urbanas. Entre as cidades da região, 19 são associadas ao Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia e Palmas faz parte da Aliança pela Ação Climática – ACA Brasil.
Gerente de Baixo Carbono e Resiliência do ICLEI América do Sul, Mariana Nicolletti citou a potencial contribuição do projeto para um desenvolvimento socioeconômico inclusivo e centrado nas pessoas na região.
“Não podemos pensar em uma única solução para ser aplicada em todos os territórios, pois eles são heterogêneos. As soluções precisam ser pensadas de baixo para cima”, defendeu Nicoletti. “É preciso conhecer os desafios territoriais para debater modelos de desenvolvimento adaptáveis a cada um deles.”
O projeto pretende ainda suprir a carência de mecanismos regionais para disseminação de conhecimentos e troca de experiências bem sucedidas, incentivando a cooperação e novos modelos de governança. Além de criar um espaço de diálogo entre cidades e instituições financeiras atuantes na Amazônia Legal, o projeto prevê a publicação de materiais sobre a elaboração de projetos climáticos financiáveis a serem publicados na plataforma subnacional Para o clima, capitaneada pelo iCS.
Contribuição à NDC brasileira
O Secretário Executivo do ICLEI América do Sul, Rodrigo Perpétuo, destacou três aspectos que orientarão a implementação do projeto: a representação das cidades amazônicas; o estímulo à troca de experiências e cooperação intermunicipal; e a ambição climática. “A intenção deste projeto é dar luz às experiências dos municípios e permitir que as cidades amazônicas tenham mais um instrumento a seu favor em busca do desenvolvimento sustentável.” Perpétuo ressalta ainda a importância das cidades amazônicas ampliarem seu protagonismo na agenda climática internacional, por meio da atuação nas COPs (Conferência da ONU sobre Mudança do Clima) 26 e 27.
Para a Coordenadora do Portfólio de Política Climática e Engajamento do iCS, Marina Marçal, o crescente índice de desmatamento na Amazônia somado à necessidade cada vez mais latente por uma recuperação econômica verde e justa tornam os financiamentos para a região ainda mais atrativos. “Os atores subnacionais têm sentido a urgência de buscar recursos próprios para executarem projetos de ação climática. À medida em que as cidades aumentam potencial técnico para criarem projetos climáticos financiáveis, há uma contribuição direta para implementação da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira, já que as cidades são as grandes responsáveis pelas ações tanto de adaptação quanto de mitigação à mudança do clima.”
Secretário Executivo Adjunto do ICLEI América do Sul, Rodrigo Corradi encerrou o evento reforçando a necessidade de compromisso político dos municípios amazônicos com a agenda climática. “Criar política é criar compromisso. Com muita satisfação iniciamos esse processo direcionado para apoiar as cidades da região a qualificar seus corpos técnicos e aceder aos financiamentos disponíveis para o território.”
Entre os próximos passos do projeto estão a articulação com governos e organizações com atuação local na agenda climática, além de um encontro sobre compromissos políticos e um convite para as primeiras capacitações.
Materiais
Acesse a seguir as apresentações em Powerpoint realizadas durante o evento:
- Prefeitura de Manaus, sobre desafios e oportunidades de financiamento para governos locais
- ICLEI América do Sul, com informações sobre o projeto
Confira o evento na íntegra:
ICLEI e Amazônia
Desde 2019, o ICLEI América do Sul busca aprofundar sua atuação na região amazônica, estreitando relacionamento com atores e governos locais. Neste sentido, desenvolveu iniciativas e projetos para conhecer os desafios das dinâmicas urbanas deste território e pensar soluções capazes de impulsionar o desenvolvimento sustentável com a manutenção da floresta em pé.
O Fórum de Cidades Pan-Amazônicas (FCPA), por exemplo, é um processo multi-ator que fomenta o diálogo horizontal e a troca de conhecimentos e experiências entre governos locais da região pan-amazônica. A iniciativa, facilitada por meio de uma parceria entre o ICLEI América do Sul, a WayCarbon e a Fundação Konrad Adenauer, por meio do Programa Regional de Segurança Energética e Mudanças Climáticas (EKLA), reúne representantes das pastas de Planejamento e Desenvolvimento Sustentável de cidades amazônicas do Brasil, Colômbia, Equador e Peru.
ICLEI e financiamento climático
Em relação ao financiamento para a ação climática local, entre as experiências que servem de referência para o projeto, destaca-se o LEDS Lab, iniciativa que desenvolveu uma metodologia para fortalecimento de capacidades e apoio para a estruturação de projetos financiáveis. A metodologia foi aplicada em quatro cidades – duas no Brasil e duas na Colômbia. Estão sendo instalados quatro projetos piloto de geração de energia solar e quatro centros educativos como demonstrativos do potencial em promover intervenções físicas nas cidades como desdobramento de um processo de aprendizagem e de maneira vinculada às políticas e compromissos climáticos.