Entre os dias 11 e 13 de junho, Campinas (SP) foi sede do 2º Encontro Regional Sudeste do ICLEI Brasil, reunindo mais de 500 participações de representantes dos governos federal, estadual e municipal; organizações internacionais; especialistas; academia; terceiro setor e sociedade civil, em uma mobilização em torno da agenda climática e do desenvolvimento urbano sustentável. O evento consolidou-se como um espaço estratégico de diálogo e cooperação para o avanço da governança climática multinível rumo à COP30.
A semana repleta de atividades em Campinas teve início no dia 10 de junho, com a realização da 1ª Oficina Participativa do Plano Nacional de Arborização Urbana (PlaNAU) que visa expandir a arborização nas áreas urbanas, promover a biodiversidade, melhorar a qualidade de vida e enfrentar a emergência climática. Com mais de 200 participantes e representantes de cerca de 70 cidades da região Sudeste, a iniciativa é parte integrante do Programa Cidades Verdes Resilientes (PCVR) coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e implementada pelo ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade, em parceria com a Universidade Federal do Alagoas (UFAL) e com apoio de instituições de ensino e pesquisa e da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana (SBAU).
Já no dia 11 de junho, ocorreu o Diálogo AdaptaCidades, voltado à capacitação e mobilização dos governos locais para a adaptação climática urbana. Com o apoio dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação e Cidades e do Meio Ambiente, busca fortalecer as políticas de adaptação e resiliência climática, promovendo a integração e a articulação entre governos em níveis nacional e local.
Outro destaque foi a Reunião Regional Sudeste do Fórum CB27, que reuniu secretários e secretárias de Meio Ambiente das capitais da região sudeste. A conversa teve como foco o engajamento rumo à COP 30, integrando as agendas climática e de biodiversidade e promovendo alinhamentos entre estas cidades para ações climáticas e ecológicas. Berenice Domingues, Coordenadora Nacional-Adjunta CB27, esteve presente, além de representantes do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Guarujá, Campinas e Pindamonhangaba.
Participação multinível no 2º Encontro Regional Sudeste
Com a presença de aproximadamente 60 palestrantes, o encontro teve representação de todos os níveis de governo — federal, estadual e municipal — além de instituições como ONU-Habitat, Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e Energia (GCoM), GIZ (agência alemã de cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável), CDP e diversos representantes da sociedade civil, iniciativa privada, academia e terceiro setor. “Este tipo de representatividade permite a articulação entre setores e impulsiona encaminhamentos concretos em prol da agenda climática e da biodiversidade, como a pauta do federalismo climático, que visa fortalecer a cooperação entre os diferentes entes federativos para que possam desenvolver políticas públicas mais integradas e eficazes para mitigação e adaptação às mudanças climáticas”, explica Rodrigo Perpétuo, Secretário Executivo do ICLEI América do Sul.
A temática foi amplamente debatida na programação através da participação de representantes como Inamara Melo, Diretora de Políticas para Adaptação e Resiliência à Mudança do Clima no MMA; Diogo Franco, Subsecretário de Gestão Ambiental na Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Minas Gerais e Natália Resende, Secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado de São Paulo, no painel “Federalismo Climático: Adaptação na Perspectiva Multinível”.
Ao total, sete palestras técnicas foram realizadas com o objetivo de aprofundar debates e fortalecer capacidades para a implementação de políticas públicas voltadas à agenda climática e de biodiversidade nos municípios brasileiros, abordando temas como financiamento climático, soluções baseadas na natureza, infraestrutura verde, governança territorial e planejamento urbano resiliente. A palestra magna, ministrada por Thelma Krug, pesquisadora sênior do INPE, por exemplo, trouxe uma reflexão sobre a “Ação Climática Local como Pilar para um Futuro Resiliente e Equitativo no Brasil”, destacando o papel estratégico das cidades brasileiras no alcance das metas nacionais de mitigação e adaptação climática e trazendo como mensagem-chave a relevância de políticas públicas baseadas em pesquisas científicas.
O prefeito de Campinas, Dário Saadi, marcou presença no evento e participou do painel “A adaptação baseada na natureza: o papel central da biodiversidade para a resiliência urbana” ao lado de Rodrigo Corradi, Diretor do ICLEI Brasil; do professor Carlos Alfredo Joly (UNICAMP/IPBES); com destaque para a experiência internacional através das contribuições de Paula Palacio, Diretora da Área Metropolitana do Vale do Aburrá (Medellín); Felipe Ehmke, Diretor de Mudanças Climáticas de Curitiba; e Rodrigo Ashiuchi, Secretário Municipal do Verde e Meio Ambiente de São Paulo. O debate focou no papel crucial dos governos locais na implementação de estratégias para integrar a biodiversidade no planejamento urbano, promover a restauração de ecossistemas e engajar as comunidades locais na proteção da natureza.
Outro painel de destaque foi a mesa “Da COP16 à COP30: Interseções entre as Agendas de Biodiversidade e de Adaptação às Mudanças Climáticas”, moderada por Rodrigo Perpétuo, Secretário Executivo do ICLEI América do Sul, que contou com introdução de Cristiana Seixas (UNICAMP/IPBES) e a participação de Maurício Guerra, Diretor de Meio Ambiente Urbano do MMA; Rogério Gutierrez, Diretor do Projeto ANDUS; Luiz Gustavo Gallo Vilela, Coordenador de Programas no ONU-Habitat e Hélinah Cardoso, Conselheira Sênior na América Latina do Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e Energia. O painel também contou com experiências práticas aplicadas na cidade de Campinas, com a contribuição de Carla Camarneiro, Engenheira Ambiental da Prefeitura Municipal de Campinas e Ângela Guirao, Bióloga da Prefeitura Municipal de Campinas.
Financiamento climático e papel do setor privado para a agenda do clima
Entre os temas prioritários na agenda da COP 30 está o financiamento climático com foco na necessidade de ampliar os recursos financeiros destinados à mitigação e adaptação às mudanças climáticas, especialmente para os países em desenvolvimento, que enfrentam maiores desafios para implementar ações eficazes. No painel “Caminhos para Financiar a Implementação das Agendas Locais e Globais de Clima e Biodiversidade”, foram discutidas estratégias de financiamento e cooperação internacional, com participação da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), da Carbon Disclosure Project (CDP), do Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF), do Fundo Global para o Desenvolvimento das Cidades (FMDV) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O momento marcou ainda o lançamento da chamada para projetos do TAP Brasil e a assinatura do termo de apoio da ABDE aos encontros do ICLEI.
Em seguida, foi abordado o papel do setor privado na promoção de políticas sustentáveis e no fomento de medidas inovadoras na mesa “Contribuições do setor privado na agenda climática”, moderada por Ana Wernke Representante Institucional do ICLEI no Estado de São Paulo, com falas de Ricardo de Figueiredo, Diretor Executivo da NetZero; Maria Luiza Maia, Analista de Sustentabilidade Sênior da MRV, e considerações de Maria Clara Nascimento (CDP) e Mário Jorge Lançone (Prefeitura de Campinas).
Justiça climática e protagonismo de juventudes
Ao discutir o enfrentamento às mudanças climáticas, é essencial incorporar a perspectiva da justiça climática, reconhecendo os aspectos de direitos e equidade como fundamentais para acelerar a descarbonização e alinhar o desenvolvimento urbano às metas climáticas em múltiplos níveis, promovendo um futuro mais justo e sustentável. Durante o encontro, a temática foi abordada com a participação de Braulio Diaz (High-Level Climate Champions), Amanda Costa (Instituto Perifa Sustentável) e representantes dos municípios de Contagem, Itabirito e Osasco e Campinas. “Precisamos conseguir trazer a justiça climática para a ação, para a prática, para os nossos projetos e políticas e para a nossa sociedade”, encerrou Amanda Costa depois de apresentar um guia elaborado pelo Perifa Sustentável que ensina a como fazer incidência política climática na prática.
Durante o encerramento do Encontro, o ICLEI América do Sul e a Prefeitura de Campinas anunciaram os vencedores da chamada pública “Mutirão pelo Clima”, iniciativa que reconhece e fortalece projetos liderados por jovens voltados à adaptação climática e à construção de resiliência, em consonância com as últimas cartas da Presidência da COP 30 no Brasil, que propõem contribuições autodeterminadas como complemento às NDCs do Acordo de Paris.
Três iniciativas foram reconhecidas: “Mulheres que Alimentam Cidades”, criado em Itatinga e reformulado em Piracicaba, promove renda, assistência alimentar e capacitação para mulheres em situação de vulnerabilidade; “Educação em Saúde para Pessoas Idosas Frente às Ondas de Calor”, realizado em Campinas, ofereceu oficinas de autocuidado e prevenção a 102 idosos de áreas vulneráveis; e “Educação Ambiental na ETECAP”, conduzido por alunos e professores da Etecap (Campinas), envolve recuperação ambiental, reciclagem e conscientização sobre mudanças climáticas. A premiação deu visibilidade a soluções transformadoras que refletem os saberes, a diversidade e a força das juventudes frente à crise climática.
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O evento marcou ainda o lançamento da parceria do ICLEI com o Instituto iSocial, que atua na promoção da inclusão social por meio da tecnologia, ciência de dados e inteligência territorial, com foco na geração de soluções inovadoras para políticas públicas. A parceria culminou na solução de uma plataforma de educação climática integrada e colaborativa que calcula a pegada individual de carbono e busca promover mudanças de comportamento por meio da educação ambiental. Dessa forma, utiliza elementos de jogos e desafios para engajar a comunidade escolar e municipal em ações pró-meio ambiente de forma divertida e envolvente.
A entrega simbólica do Plano de Ação Climática de Pindamonhangaba também ocorreu durante o Encontro, com a presença de Rafael Lamana, Secretário de Meio Ambiente de Pindamonhangaba, e Alexandre Pereira Costa, Secretário de Comunicação e Eventos do município. Com o lançamento do PLAC Pinda ProClima, a cidade oficializa seu compromisso com ações estratégicas para mitigar as emissões de gases de efeito estufa, aumentar a resiliência urbana diante das mudanças climáticas e promover justiça ambiental e inclusão social.
Visitas Técnicas
Realizadas no último dia da programação do 2º Encontro Regional ICLEI Sudeste, as visitas técnicas em Campinas apresentaram aos participantes iniciativas locais distintas, porém complementares, que demonstram o potencial das ações municipais para impulsionar o desenvolvimento urbano sustentável. Um dos grupos visitou a Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Mata de Santa Genebra, o maior remanescente de Mata Atlântica da Região Metropolitana de Campinas e uma das principais florestas urbanas do Brasil. A atividade evidenciou o trabalho da Fundação José Pedro de Oliveira com ações de manejo, conservação e educação ambiental, incluindo trilhas ecológicas, viveiro de mudas nativas, meliponário e borboletário — reforçando a importância da preservação dos recursos naturais e dos serviços ecossistêmicos em áreas urbanas.
O segundo grupo conheceu a Usina Verde Sustentável, referência em economia circular e gestão de resíduos orgânicos. Lá, os participantes acompanharam as etapas do processo de compostagem termofílica, que transforma resíduos de poda urbana e sobras alimentares da Ceasa Campinas em fertilizante orgânico de alta qualidade. A iniciativa demonstra como políticas públicas bem estruturadas podem gerar soluções ambientais, sociais e econômicas, ao reduzir o envio de resíduos para aterros e valorizar materiais orgânicos em larga escala. As visitas técnicas ampliaram a perspectiva de gestores públicos, técnicos e especialistas sobre soluções integradas e eficazes, alinhadas à proposta do Encontro de inspirar novas iniciativas e fortalecer a capacidade dos governos locais na construção de cidades mais resilientes, inclusivas e sustentáveis.
Carta Campinas
O 2º Encontro Regional ICLEI Sudeste culminou na elaboração da Carta Campinas, documento que será apresentado na 30ª Conferência das Partes da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Mudança do Clima (COP 30), que ocorrerá em novembro, em Belém (PA). A Carta propõe os fundamentos estruturantes da atuação climática do Brasil rumo à COP 30. O documento será revisado, porém, em linhas gerais, propõe o seguinte:
– Integração entre as agendas de biodiversidade e clima: priorizar a intersecção das agendas, articulando os compromissos das COPs 16 e 30, por meio de abordagens de Soluções Baseadas na Natureza (SBNs) para promover a conservação e proteção da biodiversidade e o alcance de metas de adaptação e mitigação.
– Reconexão do cidadão à natureza: educação climática como política pública para uma mudança transformadora que promova a reconexão do cidadão à natureza, o pertencimento à comunidade e ao território, alterações nos hábitos de consumo, indispensáveis para o enfrentamento da crise climática e da perda de biodiversidade.
– Justiça climática como eixo estruturante: priorizar a integração de comunidades mais afetadas no planejamento e implementação da agenda climática, com o apoio a projetos de ação e empoderamento climático e o reconhecimento do protagonismo de lideranças infanto-juvenis, mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e coletivos periféricos, em diferentes níveis de vulnerabilidade. A equidade e o diálogo intergeracional devem ser princípios da ação climática.
– Valorização do conhecimento e de soluções locais: fomentar tecnologias e práticas que valorizem e incorporem o conhecimento local, ancestral e tradicional, promovam a economia circular e fortaleçam a adaptação e resiliência urbana.
– Transversalidade da agenda climática nas políticas públicas locais: integrar ações de mitigação, adaptação e resiliência nos instrumentos de planejamento do território, e nas políticas sociais, de inovação tecnológica, de educação, de saúde e de geração de emprego e renda, com o objetivo de garantir a proteção da vida.
– Federalismo climático em prática: fortalecer a ação coordenada entre governo federal, estados, regiões metropolitanas e municípios para estruturar diretrizes, metas, instrumentos e indicadores que viabilizem a implementação de projetos de mitigação e adaptação climática pautados em serviços ecossistêmicos e que incorporem Soluções Baseadas na Natureza (SBNs).
– Cooperação multinível: construir e fortalecer parcerias entre governos, academia, atores privados, organizações internacionais e sociedade civil, com o objetivo de consolidar uma governança multinível e multissetorial que potencialize a implementação e difusão da agenda local e global unificada de clima e biodiversidade.
– Ampliação do acesso a mecanismos de financiamento climático: garantir condições específicas para governos locais, como o estímulo a mecanismos de financiamento a fundo perdido, assegurando que a responsabilidade financeira pela ação climática não recaia de forma desproporcional sobre estados e municípios, especialmente aqueles com menor capacidade fiscal e maior vulnerabilidade.
– Fortalecer a capacidade institucional e operacional dos municípios para captar, executar e monitorar projetos alinhados às suas realidades. Ressalta-se a importância da definição de estratégias de financiamento climático para governos subnacionais, incluindo o fomento e a inclusão em planos plurianuais, LOA e LDO, para prever os recursos para implementação das ações climáticas.